domingo, 2 de agosto de 2009

Chrome pode ser rival verdadeiro para Windows


Se há momentos em que você se sente frustrado com o seu computador pessoal - e quem nunca passou por um momento como esse? -, o Google afirma que está trabalhando em uma solução.

Muita gente perde a paciência facilmente com computadores que demoram demais para ser acionados e são propensos a quedas, vulneráveis a ataques por vírus e vivem em constante necessidade de atualizações complicadas. Na esperança de transformar essa irritação em uma forma de ganhar vantagem sobre os concorrentes, o Google decidiu desenvolver seu próprio sistema operacional - o software básico que aciona as mais básicas funções de um computador.

Ao se dedicar a produzir esse tipo de software, o Google está apresentando um desafio aberto ao domínio do mercado pela Microsoft, cujo sistema operacional Windows está em uso em cerca de 95% dos computadores pessoais do planeta. O Google promete que o seu sistema operacional Chrome, que estará disponível como parte de alguns computadores já no segundo semestre do ano que vem, enfatizará a velocidade, a simplicidade e a segurança.

Para isso, a empresa terá de superar imensos obstáculos. Gigantes da computação como a IBM e a Sun Microsystems passaram anos batalhando para derrubar a Microsoft de sua posição de mercado dominante, e não têm muitos resultados a apresentar por todo esse esforço.

Mas caso o projeto venha a ganhar ímpeto, o plano do Google poderia não só solapar a posição do Windows como a o do outro pilar de mercado multibilionário da Microsoft, o pacote de aplicativos Office. O Google está tentando fazer do navegador de internet a peça central na vida digital dos usuários de computadores, e isso relegaria sistemas operacionais de alta complexidade, como o Windows, a um papel secundário.

"Não estou dizendo que os acionistas da empresa deveriam tirar seu dinheiro de lá correndo, mas esse é o começo do fim para a Microsoft, pelo menos na forma em que costumávamos conhecê-la", disse Jean-Louis Gasseee, um executivo de capital para empreendimentos que já combateu a Microsoft dos cargos que exerceu na Apple e em uma empresa de computação que ele mesmo fundou, a Be.

Um porta-voz da Microsoft, Frank Shaw, se recusou a comentar sobre o anúncio feito pelo Google ou sobre a ameaça que isso poderia representar em termos de competição.

A missão primordial do novo sistema operacional será acionar o navegador Google Chrome, que servirá como plataforma de lançamento rápida para acessos a sites e aplicativos online como o Gmail e o Facebook.

"Estamos projetando um sistema operacional cujo objetivo será a leveza e a rapidez, para permitir acesso à web em questão de segundos", afirmaram Sundar Pinchai, vice-presidente de administração de produtos, e Linus Upson, diretor de engenharia, em um post no blog do Google no qual anunciavam o novo projeto, na terça-feira. "Nós conversamos bastante com os nossos usuários, e a mensagem que recebemos deles é bastante clara: os computadores precisam melhorar muito".

O plano é parte da aposta do Google em que uma imensa virada na computação já está em curso. Na opinião do Google, as conexões com a internet se tornarão tão rápidas e os navegadores tão poderosos que a maioria dos programas hoje executados nos computadores poderão ser substituídos por aplicativos disponíveis online. Isso eliminaria a necessidade de instalar, atualizar e de realizar backups de software em cada máquina.

Os analistas afirmam que os avanços na tecnologia tornam essa visão de mercado muito mais realista hoje do que costumava ser o caso quando a Netscape, a pioneira nos navegadores comerciais para a internet, propôs cenário semelhante, uma década atrás.

Mas a Microsoft continua a desfrutar de muitas vantagens. A empresa conseguiu convencer seus parceiros no ramo do software a continuar produzindo jogos, programas de mídia, software para declaração de impostos e outros aplicativos que funcionam exclusivamente com o Windows. E dedica seu tempo e dinheiro a garantir que uma ampla variedade de dispositivos, tais como câmeras e impressoras, funcionem bem com o seu software.

Embora o novo software do Google deva ser oferecido gratuitamente aos usuários, outros programas gratuitos já tentaram desafiar o domínio da Microsoft, sem grande êxito. Algumas poucas companhias oferecem o sistema operacional de fonte aberta Linux como alternativa ao Windows, mas o Linux não conseguiu conquistar mercado suficiente para enfraquecer a Microsoft. (O sistema operacional Chrome terá o Linux como parte de seu núcleo, e, como o Linux, será um software de fonte aberta, o que significa que programadores externos terão a capacidade de modificá-lo como preferirem.)

Além disso, o sistema operacional do Google por enquanto está apenas em estágio inicial de desenvolvimento, e não existe garantia alguma de que a empresa seja capaz de cumprir as promessas que está fazendo. Outros projetos de software do Google, como o do sistema operacional Android para celulares, até o momento obtiveram sucesso apenas limitado no mercado.

No entanto, no caso do mais recente esforço do Google há quem argumente que a empresa certa enfim desenvolveu a ideia certa no momento certo.

"O Google tem uma oportunidade razoável de redefinir o paradigma para os computadores", disse Mark Shuttleworth, presidente-executivo da Canonical, produtora de uma versão do Linux chamada Ubuntu.

Em lugar de comprar computadores de mesa grandes e dispendiosos, nos últimos meses os consumidores têm se voltado cada vez mais a pequenos laptops de baixo custo conhecidos como netbooks, que servem essencialmente como ferramentas de acesso à web. O Google diz que seu sistema operacional será dirigido inicialmente aos netbooks, os quais em geral não têm potência suficiente para operar com a mais recente versão do Windows.

O modelo de negócios fundamental do Google também funciona de maneira que beneficia o novo projeto. A empresa afirma acreditar que oferecer o Chrome de maneira gratuita aos fabricantes de computadores valerá a pena porque isso levará mais usuários a dedicar mais tempo à internet, e com isso ao uso do serviço de busca do Google e aos seus demais aplicativos disponíveis via web, tais como o Google Docs, que serve como rival online para o Microsoft Office. Isso, por sua vez, ajudaria o Google a faturar mais com publicidade, a fonte que responde por praticamente toda a sua receita anual de US$ 22 bilhões.

Essa abordagem praticamente coloca de cabeça para baixo a dinâmica que a Microsoft explorou para esmagar a Netscape. Na época, a Netscape vendia o seu navegador para por US$ 50, e a Microsoft solapou a liderança da companhia no mercado ao oferecer gratuitamente o seu navegador de internet, o Internet Explorer. Agora, é a Microsoft que precisa enfrentar novos rivais gratuitos ao domínio do Windows e do Office, suas duas maiores fontes de receita.

Sob o modelo proposto, o Google poderia até mesmo pagar os fabricantes de computadores para que instalem seu software nas máquinas que vendem, essencialmente subsidiando os custos das companhias.

"Caso o hardware seja gratuito e o software seja gratuito, a única maneira de ganhar dinheiro seria com os serviços, e é isso que oferece o Google", disse Jim Zemlin, diretor executivo da Linux Foundation.

A Microsoft, embora tenha reagido com lentidão, não está imobilizada. A empresa está desenvolvendo muitos aplicativos semelhantes aos oferecidos pelo Google, embora até o momento venha relutando em oferecê-los gratuitamente.

Além disso, a Microsoft agiu de maneira a conter o ganho de popularidade do Linux no mercado de netbooks. Quando primeiro surgiram, dois anos atrás, a vasta maioria dos netbooks chegou ao mercado equipada com o Linux. Hoje, o Windows XP, um sistema operacional mais antigo da Microsoft, equipa mais de 90% dos netbooks dos Estados Unidos, de acordo com o grupo de pesquisa de mercado NPD.

Mas nenhum desses esforços será capaz de propiciar o nível de lucro de que a Microsoft desfrutou enquanto o dominava o mundo da computação, ao longo das duas últimas décadas.

"Existem respostas para a Microsoft, mas todas elas envolvem um modelo de negócios significativamente menos lucrativo", disse David Yoffie, professor da escola de administração de empresas da Universidade Harvard.

Tradução: Paulo Migliacci ME


The New York Times

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